Beatriz Rizek
Escola do Futuro da Universidade de São Paulo
biarizek@futuro.usp.br
Educação a Distância nos Sistemas Educacionais
Educação Corporativa
Resumo
O projeto da Fundação Alavanca, em parceria com a Escola do
Futuro da Universidade de São Paulo, o SEBRAE-SP e a montadora Volkswagen,
contribuiu para disseminar a cultura de inclusão digital por meio do
Projeto Conectbus, um ônibus com nove micros conectados à internet
que visitou vinte e três municípios do Estado de São Paulo.
Foram promovidas ações de introdução ao uso do computador
e ao acesso à internet, atendendo aos empresários empreendedores
e demais interessados da comunidade local. A seguir, as informações
estruturantes deste projeto, seu desenvolvimento e avaliação sob
a ótica educativa.
Palavras-chave:
Iniciação tecnológica, Ônibus como sala de aula,
Pontos móveis de internet
Justificativa
O Ministério da Educação (MEC) criou em 1997 o Programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo), com o objetivo de introduzir novas tecnologias de informação e comunicação nas escolas públicas de ensino fundamental e médio. De 1997 a 1999, o governo federal investiu cerca de R$113,2 milhões no ProInfo, tendo destinado 85,5% desse recurso para compra de hardware e software e montagem de laboratório de informática nas escolas. O restante foi utilizado na capacitação de professores. De acordo com o MEC, até dezembro de 2002, o total investido no ProInfo chegou a R$206 milhões. O número de computadores instalados no programa ficou bem abaixo das metas estabelecidas pelo próprio governo: apenas 51% dos 105 mil que se esperava atingir. Apesar disso, o ProInfo superou as expectativas em relação à capacitação de professores diretos, professores multiplicadores e técnicos de suporte. Ainda segundo o MEC, cerca de 6 milhões de crianças foram beneficiadas pelo programa.
No entanto, como era de se prever, o mapa de exclusão digital começou a se configurar a partir do crescimento do território da inclusão que atingia aos participantes do ProInfo. Nascia, assim, a expressão “inclusão digital”, uma necessidade sócio-cultural relevante para educadores e também para empreendedores, profissionais liberais, funcionários terceirizados ou quarterizados que contribuem para o desenvolvimento econômico do País e que dependem das Novas Tecnologias de Comunicação e Informação (NTCIs) para aprimorar seu trabalho e a compreensão do conjunto comunicacional que conecta o mundo todo.
Projeto ConectBus – a solução brasileira de inclusão digital itinerante
Com o firme propósito de disseminar a cultura de pesquisa virtual aliada, dentre outros elementos, à comunicação impactante e inovadora via internet, o Projeto Conectbus atendeu a cerca de 40 mil pessoas em 23 municípios do Estado de São Paulo. A rica diversidade de participantes proporcionou interação entre adultos em fase inicial de alfabetização; grupos de terceira idade; educação infantil, ensinos fundamental I e II, ensino médio, superior, profissionalizante e, sobretudo, empreendedores: pessoas que querem abrir seu próprio negócio, não se importando em começar por uma significativa mudança em sua própria visão de mundo, transferindo a si próprio a responsabilidade desafiadora de se autosustentar, ser chefe de si mesmo e aprender a ter disciplina para produzir bens ou prestar serviços a terceiros com qualidade, rapidez e de forma global, via internet.
A apresentação do site do SEBRAE, por exemplo, sob orientação dos monitores do Projeto, fez com que muitos se sentissem estudando novamente, pois voltavam ao Conectbus várias vezes, até mesmo para registrar seu aprendizado em pedaços de papéis improvisados, contendo algumas das principais informações novas lá capturadas (“reforma tributária”; “novo código civil”; “incubadoras de empresas; dentre outras). Aqueles que não conseguiam escrever tudo que lhes interessava, anotavam o endereço do site para posterior visita, normalmente com novos acompanhantes empreendedores.
O programa de inclusão digital do Conectbus iniciava-se com palestras interativas (evento totalmente presencial, com monitoria individual e coletiva) dentro do ônibus: os temas estavam em apresentações powerpoint previamente instaladas, de forma a atender imediatamente à diversidade de interesses, conhecimento operacional dos aplicativos e da internet e, também, à diversidade de faixa etária, especialmente quando o público era constituído por estudantes. A interação com o computador acontecia quando o participante tinha a iniciativa de tentar operar a máquina, ainda que por ensaio-e-erro, explorando, por exemplo, sites de interesse, com direito a cadastro online (para quem tinha um e-mail) e pesquisa em buscadores, descobrindo as opções para fazê-la: por palavra-chave, por autor, por título ou por busca boleana.
A primeira palestra foi sobre “As partes que compõem o computador”, para desmistificar o micro e torná-lo familiar ao participante, em termos de hardware e software. Em seguida, o tema tratado era “Internet básica”, com iniciação ao uso da rede mundial de computadores e direito a momentos de exploração livre. No caso de estudantes, a navegação era devidamente orientada, voltada para assuntos escolares e de entretenimento. No caso dos empreendedores, os próprios sites das instituições parceiras eram objeto de exploração e navegação livres, iniciando com um cadastro online para recebimento de newsletter ou informações simples. Grande parte do público de micro, pequena e média empresa optava por pesquisar sobre mercados estrangeiros ou de outros Estados brasileiros, analisando e comparando os dados coletados. Neste momento, aproveitava-se para alertar sobre a velocidade com que as informações trafegam na internet, atentando para a impermanência da informação, sua rápida obsolescência e a importância da fidedignidade da fonte geradora e distribuidora dessa informação.
Impacto e avaliação de resultados
Atender a um público tão diversificado resultou em reações impactantes de ambas as partes, do lado de quem orientava e de quem interagia com a máquina. Começando com os empreendedores locais - pessoas simples, em sua maioria dedicadas ao artesanato, à culinária caseira de doces e salgados para festas e à agricultura doméstica – a emoção era muito semelhante à de estar assistindo à tv pela primeira vez: uma tela de computador se parecia com a tela de uma televisão, só que obedecia ao quê o professor ou ao quê o participante quisesse. No lugar de uma mudança de canal, dava-se um “click” no “mouse” e, rapidamente, muita coisa era alterada: os textos em Word poderiam ser coloridos, as figuras inseridas ou retiradas, a fonte aumentada... e o quê dizer da internet? O mundo todo conectado, “plugado” ali, à sua frente. Era possível conversar remotamente (algumas pessoas, embora simples, sabiam como entrar em chats, e ensinavam às demais), trocar idéias, fazer brincadeiras, descrever o local de onde se estava teclando.
Com essas descobertas, os pequenos empreendedores queriam saber o quê fazer para oferecer seus produtos e/ou serviços “para aquele computador” (sic). Outros, mais ousados, queriam saber se o governo tinha seu espaço na internet e de que forma poderiam conhecer tudo o que era oferecido para o cidadão. Aprenderam a pagar contas, a calcular aposentadorias em planos de previdência, a entrar no site ou blogers de parentes e a ler jornais e revistas pela internet.
As pessoas que se dispunham a explorar com mais afinco, voltavam nos dias seguintes
com novos desafios para si próprios, sendo que o último era encontrar
sozinho aquilo que buscavam: autonomia para a pesquisa, tivesse ela a natureza
que fosse.
Os empreendedores de pequeno e médio portes procuravam se familiarizar
com programas de computador para agilizar a comunicação inter-empresarial
(intranet), para evitar invasões de hackers e programas operacionais
de baixo custo. Educação a distância também era foco
de seus interesses, com buscas de cursos do tipo MBA.
Adultos em fase de alfabetização pediam para visitarem sites que tinham games e jogos de entretenimento com muito movimento, personagens conhecidos (especialmente da Disney e de Harry Portter) e som, mesmo que fosse em inglês, pois o que lhes interessava eram as músicas e não seu conteúdo ou a relação com o contexto da imagem.
Por fim, estudantes pediam para aprender a fazer pesquisas escolares, mas enfatizavam o desejo de visitarem sites de artistas, de revistas próprias para a idade e, principalmente, jogos inteligentes da categoria role-playing-game. O entusiasmo era contagiante, muitos resistiam ao aviso de “tempo esgotado, hora de sair”. Crianças com pouca ou quase nenhuma escolaridade sentiam estar superando seus medos e receios de estarem em um local impróprio para elas, imposto pelas condições sócio-culturais. Elas descobriram a democratização do ensino e, mais do que isso, descobriram a oportunidade de aprender.
Conclusão
A experiência da Fundação Alavanca com o Projeto Conectbus comprovou que a inclusão digital é possível, graças ao formato rotativo, mambembe, que permite a todo e qualquer cidadão conhecer e desvendar os mistérios da informática, de acordo com seu nível de necessidade.
Comprovou, também, que as pessoas são pró-ativas na busca pelo aprendizado quando ele se parece com entretenimento: diverte, descontrai, faz uso da memória seletiva para se obter algo rapidamente. Mais do que isso, esse exercício pode ser praticado no dia-a-dia, num cyber-café ou numa próxima parada do Conectbus.
Referência bibliográfica
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Pedagógicos de Reflexões, número 25, NEA/FE-USP, 2003