ECCOLOGOS: AUTORIA COLETIVA DE DOCUMENTOS

Abril/2004

Ademir da Rosa Martins
PPGIE/CINTED/UFRGS, ademir@pgie.ufrgs.br

Margarete Axt
PPGIE e PPGEDU/UFRGS, maaxt@vortex.ufrgs.br

 

Tema: Educação a Distância nos Sistemas Educacionais
Categoria: Educação Universitária

Resumo:
O processamento de textos é uma das atividades mais utilizada no uso que se faz dos computadores. Com a ampla utilização da Internet muitas aplicações têm se adaptado e migram suas interfaces para a Web. A necessidade de trabalhar em grupo requer ferramentas que ajudem as pessoas a produzir documentos colaborativamente. O EccoLogos pretende preencher essa lacuna oferecendo facilidades tanto na área da edição dos textos como na coordenação de ações da tarefa de produção coletiva de documentos.

Palavras chaves:
cooperação, autoria coletiva, ambientes virtuais, educação a distância.


1. Introduçâo

Desde a chegada dos microcomputadores na década de 70, estudam-se formas de utilizá-lo para melhorar a produtividade de várias atividades, tanto as individuais como as coletivas, onde se exige um esforço cooperativo na sua execução [Grudin, 1994]. A disseminação do uso da Internet, por sua vez, tem motivado a migração de ferramentas antes usadas isoladamente no microcomputador, para um uso compartilhado através da Web.

Uma das atividades mais realizadas no computador, sem dúvida, é a edição de documentos. Inúmeros editores de texto têm sido desenvolvidos ao longo do tempo e diversas propostas têm sido apresentadas ao público usuário. O mercado tem feito com que algumas características se tornem um padrão. A necessidade de meios de edição toma, nos dias atuais, outro sentido, pois pessoas que estão geograficamente dispersas necessitam participar da construção de relatórios, memorandos, pareceres técnicos, artigos, etc. Isso se torna evidente, não só no âmbito corporativo e de pesquisas, mas, sobretudo, na área educacional, onde é grande a necessidade de se produzir material escrito, envolvendo mais de uma pessoa, tanto por parte dos professores, quanto dos alunos, principalmente se considerarmos o grau de importância dado atualmente à Educação a Distância.

Se a escrita já apresenta suas complexidades quando feita individualmente, torna-se, sem dúvida, mais complexa, quando realizada coletivamente, pois entra em consideração a dinâmica de grupo e, por conseguinte, os desafios da colaboração Dilon [1993].

Os itens a seguir abordam questões referentes a cooperação/colaboração, autoria coletiva, autonomia e o trabalho em grupo, para depois apresentar uma proposta de ambiente de construção coletiva de documentos – o Eccologos.

 

2. Cooperação, colaboraçâo e interação

Na literatura encontram-se várias diferenciações para os termos cooperação e colaboração. Por exemplo, Roschelle e Teasley apud Brna [1998] (e, como tendência, os autores de origem anglo) conceituam o trabalho cooperativo como aquele que é realizado pela divisão de trabalho entre os participantes, numa atividade em que cada um é responsável por uma parte da solução do problema; o trabalho colaborativo, por sua vez, é visto como um engajamento mútuo dos participantes em um esforço coordenado para resolverem o problema em conjunto. Brna contesta tal definição, dizendo que mesmo na mais típica colaboração, ainda assim haverá sub-tarefas que os participantes realizarão individualmente, seja rabiscando no papel, elaborando em suas mentes, etc.

Acreditamos que numa mesma tarefa há momentos em que os membros de uma equipe trabalham de forma cooperativa e em um momento seguinte atuem colaborativamente, levando em conta as definições acima citadas. Acreditamos também que uma ferramenta de uso na Educação a Distância pode ser usada de maneiras distintas, sendo que um grupo pode estar utilizando-a de maneira colaborativa, enquanto outro atua de forma cooperativa, mas certamente, na maioria das vezes, estarão interagindo, ora de uma forma, ora de outra, embora com possível predominância de uma das formas.

Albino [2001], referenciando os autores do EquiText (1), um editor colaborativo via Web, diz que “a interação sobrepõe-se a estes dois conceitos (cooperação e colaboração), pois pode e deve abranger os dois”. Continua, dizendo que, segundo os autores citados, “o processo de interação de um grupo, pressupõe um trabalho cooperativo e colaborativo, envolvendo todos os conceitos definidos para tais questões, pois neste processo ambos os termos passam a ser sinônimos, ocorrendo uma perda do senso de propriedade, nada pertence a ninguém, tudo é produto do trabalho do grupo, há a predominância da equilibração majorante (2) e o resultado deste trabalho é a produção de textos híbridos, nascidos da reunião de idéias, ou seja, do coletivo, composto por todas as individualidades do grupo, onde cada qual teve sua parcela de contribuição, cooperação ou colaboração, como queiram”.

No âmbito deste trabalho, por adotarmos as idéias de Piaget, conforme será visto logo a seguir, iremos utilizar o termo “cooperativo” no restante do artigo, sem excluir, no entanto, os outros sentidos que se possam associar aos termos aqui discutidos.

Nas palavras de Piaget:

“Cooperar na ação é operar em comum, isto é, ajustar por meio de novas operações (qualitativas ou métricas) de correspondência, reciprocidade ou complementaridade, as ações executadas por cada um dos parceiros.” [PIAGET, 1973]

O ambiente de construção coletiva de textos proposto nesse artigo se preocupa em favorecer a interação entre os membros de um grupo, facilitando suas coordenações de ações, sendo flexível e, portanto, permitindo que se adotem as mais diferentes formas de interação, moldadas cada uma de acordo com a dinâmica do grupo.

 

3. A autoria coletiva

A utilização dos computadores para criar sistemas ou ferramentas que visam a dar suporte a que várias pessoas elaborem conjuntamente um documento deu origem a uma área de pesquisa chamada Autoria Colaborativa Mediada por Computador (CSSW - Computer Supported Collaborative Writing) [Chaim, 1998], a que, na linha de tendência francesa, referenciaríamos a partir do conceito de cooperação.

Preferimos usar o termo autoria coletiva, em vez de escrita colaborativa (do inglês collaborative writing) por dois motivos. O primeiro envolve as questões do item anterior; não querendo privilegiar, a priori, já na denominação, uma ou outra definição, evitamos os termos “colaborativa” ou “cooperativa”, adotando simplesmente o sentido de atuação coletiva no desenvolvimento de um texto. O segundo motivo é o mesmo adotado por Chaim [1998], ao entender que a tradução pura e simples de writing para “escrita” não daria o sentido amplo que há na língua inglesa, que é de processo de elaboração de textos, pois “escrita” na língua portuguesa tem um significado mais restrito de transcrição de idéias na forma textual. Querendo enfatizar o sentido de autoria das idéias expressas através de um processo coletivo de construção de textos é que utilizaremos o termo proposto.

O processo de autoria é uma tarefa complexa e cíclica. É um processo aberto, que nunca chega a um ponto de finalização concreto, pois a cada retomada do texto surgem modificações, na tentativa de sempre melhorar o sentido do que está exposto. Além da formulação em texto para expressar idéias, a autoria envolve outras atividades, como a coleta de dados, a formulação de intenções, de planejamento e a revisão de metas. A complexidade surge da necessidade de gerenciar simultaneamente estas atividades, além do comprometimento com prazos e disponibilidade de recursos. Isso poderá, dependendo do grau de complexidade, conduzir a uma 'sobrecarga cognitiva', que por sua vez poderá afetar negativamente a qualidade do texto produzido [Sapsomboon, 1997].

A autoria coletiva envolve a construção de um texto ou documento por mais de uma pessoa [Sapsomboon, 1997]. Não entraremos no mérito da finalidade do texto, que pode ser um texto literário, um relatório técnico (seja da área médica, da computação, engenharia, etc), um artigo ou um relato, um parecer, etc. Todos os tipos de documentos desenvolvidos a várias mãos envolvem as complexidades, a um só tempo, da autoria em si e da coordenação de esforços no trabalho em equipe [Dilon 1993].

 

4. Autonomia e cooperação

Com Piaget encontramos os aspectos de interação do sujeito com o objeto/meio, as condutas sociais, as trocas sociais e a cooperação autônoma.

Em sua teoria sobre a formação do conhecimento, Piaget [1987] coloca que o desenvolvimento cognitivo do ser humano ocorre através de constantes desequilíbrios e equilibrações. A cada desequilíbrio entram em ação dois mecanismos adaptativos que visam alcançar um novo estado de equilíbrio: a assimilação e a acomodação. Pela assimilação o organismo desenvolve ações destinadas a atribuir significação a partir de sua experiência anterior, aos elementos com os quais interage [Albino, 2001]. A acomodação por sua vez proporciona o estabelecimento de um equilíbrio superior com o meio ambiente. Embora sejam mecanismos distintos eles ocorrem simultaneamente, com predominância de um ou de outro, ao longo do processo de desenvolvimento. Importante ressaltar que as reequilibrações “não constituem, senão em certos casos, retornos ao equilíbrio anterior; aqueles que são os mais fundamentais para o desenvolvimento consistem, ao contrário, em formações não somente de um novo equilíbrio, mas ainda, em geral, de um melhor equilíbrio”, no sentido das equilibrações majorantes [PIAGET, 1976].

Os períodos cognitivos são marcados tanto por condutas e atividades exteriorizadas (perceptíveis) quanto interiorizadas em pensamento (diálogo interior), decorrentes das adaptações do indivíduo ao meio e que interferem em suas estruturas. Essas condutas refletem características sociais. As sociedades impõem padrões ao indivíduo pressionando-o a pensar e agir influenciado por essas imposições. É desta forma que a vida social contribui para transformar sua inteligência pela "tripla mediação da linguagem (signos), do conteúdo dos intercâmbios (valores intelectuais) e das regras impostas ao pensamento (normas coletivas lógicas ou pré-lógicas)" [Piaget 1977]. Dialeticamente, através desta mesma tripla mediação, o indivíduo influencia e modifica as sociedades onde vive, tanto quanto é influenciado e modificado por estas mesmas sociedades às quais se adapta como condição de integração social.

Tais mecanismos adaptativos levando a transformações se constituem no decorrer de um contínuo processo de trocas sociais, que se caracterizam pelos seus valores qualitativos e variam de acordo com o nível de desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Quando essas trocas envolvem duas ou mais pessoas que se unem com um fim comum, diz-se, a partir de Piaget, que há cooperação entre elas, quer seja por ações físicas, quer seja por pensamento (definições, avaliações e normas).

Os conceitos de cooperação e autonomia estão intimamente relacionados, pois para que a autonomia se desenvolva é necessário que o sujeito seja capaz de estabelecer relações cooperativas, de acordo com certas condições: presença da escala comum de valores (base comum de conceitos, em linguagem mutuamente compreensível, que proporcione a cada ser compreender as proposições do outro), conservação da escala comum de valores (manutenção e o aumento da escala comum de valores estabelecida) e presença de reciprocidade (compreensão do ponto de vista do outro e adaptação da sua participação na interação).

Segundo Moran [2003], “é importante educar para a autonomia, para que cada um encontre o seu próprio ritmo de aprendizagem e, ao mesmo tempo, é importante educar para a cooperação, para aprender em grupo, para intercambiar idéias, participar de projetos, realizar pesquisas em conjunto”.

 

5. O trabalho em grupo

Em vista dos pressupostos teórico-epistemológicos referidos acima, um dos enfoques da Educação dos dias atuais tem sido o trabalho em grupo. Nesta modalidade os membros de um grupo devem unir-se em torno de uma tarefa comum, buscando compartilhar seus conhecimentos e esforçando-se, colaborativamente e/ou cooperativamente, no sentido de atingir coletivamente as metas estabelecidas. Na educação presencial o trabalho em grupo favorece a interação social do aprendiz. Na educação a distância, além da interação social, ¬que ocorre de forma virtual, o mesmo pode tornar-se fator a mais de motivação e compromisso frente aos desafios estabelecidos para a aprendizagem, principalmente no sentido de enfatizar a dimensão coletiva na vida dos aprendizes. O trabalho em grupo propicia aos integrantes do grupo oportunidade para reflexão sobre as opiniões dos outros em contraste com as suas, melhor expressão de seus pensamentos de forma a se fazer compreendido por todos, trabalho sobre a aceitação de críticas, respeito mútuo, reciprocidade.

O uso da rede virtual telemática tem possibilitado, pela potência das idéias desencadeadas no plano do coletivo, um incremento do próprio trabalho individual. Constata Decouchant [1995] que com o passar do tempo cada vez mais há a necessidade de desenvolver a habilidade de trabalhar em grupo através do computador. Uma das funções dos ambientes virtuais de aprendizagem é proporcionar facilidades de comunicação e expressão aos usuários, de forma articulada, para que agenciamentos instituídos pelas coordenações de ações possibilitem um fluir das atividades de grupo, permitindo a confrontação e a negociação de diferentes pontos de vista, numa palavra, o diálogo, abrindo a um operar comum na direção das metas estabelecidas. Concordamos com Sharples [1992] quando considera que sinergia do grupo possibilita um transcender do nível de conhecimento e experiência do grupo para além dos níveis atingidos (e atingíveis) individualmente.

Por questões de facilidade de edição, de controle de versões, documentação, pelo agenciamento de esforços necessários para a sincronização de atividades, pela necessidade de acompanhamento do processo criativo, etc, uma atividade coletiva de autoria é forte candidata a ter um suporte informático. Com as facilidades de uso e interação, nos dias atuais, proporcionadas pela Internet, interligando os mais distintos pontos do nosso planeta, é justo pensar-se em uma ferramenta que possibilite a edição coletiva de documentos, fornecendo suporte às atividades em grupo e à autoria propriamente dita.

 

6. EccoLogos

Analisando as questões colocadas acima e refletindo sobre experiências anteriores – ou como participante da equipe de desenvolvimento do Equitext, um editor colaborativo via web, ou como integrante da equipe idealizadora da ferramenta forchat (3) - está sendo desenvolvido um ambiente de construção coletiva de documentos, o EccoLogos, como parte dos trabalhos de uma tese de doutorado de um de nós, junto à linha de pesquisa “Ambientes Virtuais de Ensino-Aprendizagem e Educação a Distância” do Programa de Pós-graduação em Informática na Educação (PPGIE), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), dentro do projeto Estudos e Criação em Hipermídia do Laboratório de Estudos da Linguagem, Interação e Cognição (LELIC/UFRGS) (4), coordenado por outro de nós.

Diversos esforços têm sido empregados, em toda parte do globo, para a construção de ferramentas voltadas à autoria coletiva. No entanto nenhuma dessas ferramentas ganhou notoriedade. Por quê? Entre as razões podemos citar requisitos estritos de algoritmos de tempo-real para que, no uso síncrono, qualquer ação do usuário seja refletida na área de trabalho comum dos outros usuários, e, em decorrência, o desenvolvimento seja feito sobre uma rede local, o que conduz, geralmente, a uma solução dependente de plataforma.

A proposta do EccoLogos (Editor Web para Construção Coletiva de Sentidos Através da Linguagem Escrita) é desenvolver um ambiente que possibilite, no seu operar, a criação de um espaço de convivência interativa, facilitando o fluir de coordenações consensuais de ações entre os usuários participantes, contribuindo para um efetivo trabalho de grupo com a finalidade específica de produção coletiva de textos/documentos. Seu funcionamento é feito estritamente através da Web, o que o torna independente de plataforma. Isso também o libera de algoritmos rígidos de funcionamento de tempo-real, embora utilize modernas tecnologias, como os Web Services, para resolver algumas questões de maior efetividade na percepção, pelos participantes, das ações dos outros (awareness). Além disso, a experiência com desenvolvimentos anteriores (Equitext, forchat), tem demonstrado que soluções simples e eficazes proporcionam um bom retorno dos usuários graças a sua satisfação e confiança.

Nas atividades de escrita coletiva é possível observar, em funcionamento, os esquemas de assimilação, acomodação e equilibração cognitivos. Cada contribuição inserida no texto pode estabelecer um desequilíbrio na construção de sentidos. A nova situação provocará desequilíbrios em diferentes graus em cada um dos membros do grupo e cada um passará pelos processos de assimilação e acomodação na busca de um equilíbrio. O próprio texto do documento também é uma criação viva e passa pelas fases de desequilíbrio e reequilíbrio: idéias desencontradas iniciais começam, aos poucos, pela interação, a produzir um fio condutor do raciocínio coletivo, conduzindo a um equilíbrio relativo na produção de sentidos a que o grupo se propõe.

De capital importância na dinâmica do grupo é a questão de valores de troca, pois cada um sempre espera um retorno avaliativo sobre suas contribuições, para identificar a aprovação ou não do restante do grupo. No EccoLogos este item é contemplado com o recurso de anotações e a utilização de “emoticons” que poderão expressar um pouco do que cada um quer transmitir. O EccoLogos procura preservar a identidade de cada contribuição informando exatamente quem criou o texto, quem colaborou. Mas como nem sempre é possível ao sistema identificar a autoria de uma idéia, existem recursos para que os próprios indivíduos possam negociar e definir uma história de sua emergência.

Existem igualmente alguns itens que o responsável pelo documento pode estabelecer ao criá-lo, como, por exemplo, quem pode apagar um parágrafo. Essa e outras regras podem ser configuradas quando da criação do documento ou podem ser colocadas em votação para que o próprio grupo possa, em seus momentos iniciais de interação, estabelecer suas próprias regras de funcionamento. Por falar em votação, será possível estabelecer a qualquer instante a colocação de uma questão e realizar uma votação para decidir em grupo sobre os rumos da construção de sentido.

Algumas outras características do EccoLogos são:

A seguir apresentamos de forma geral o funcionamento do EccoLogos. Para usar o sistema é necessário cadastrar-se (registrar-se). Todos os usuários registrados podem criar um documento. Quem cria um documento torna-se seu “coordenador”. O coordenador deve associar, dentre os usuários registrados no sistema, aqueles que irão colaborar na construção coletiva do documento. Os participantes associados ao documento são chamados de “escritores” do documento. O coordenador também faz parte dos “escritores”. O coordenador pode associar ainda um (ou mais) usuário como “observador”, que poderá observar todo o processo de escrita e fazer anotações, mas não terá privilégios de edição no texto. Será possível a associação ao texto de um (ou mais) “visitante”, pessoa sem direto de edição no documento, sem direito a fazer anotações e com visão parcial sobre o processo de escrita. O editor pode associar um “monitor”, que tem a finalidade de auxiliá-lo nas tarefas de organização do trabalho, podendo este também associar escritores, observadores e visitantes ao documento; o monitor poderá, ou não, fazer parte dos escritores. O documento é uma coleção de blocos de texto, que podem ter um ou mais elementos, como parágrafos, tabelas, imagens, objetos de áudio e vídeo, etc. Todos os escritores podem criar novos blocos de textos. O criador do bloco de texto é reconhecido pelo sistema como “autor” daquele bloco. Todos os escritores podem atuar sobre um bloco de texto após a sua criação para: modificar, deletar virtualmente, restaurar, mover, unir, separar, fazer anotações, mudar estilo, etc. Somente o autor ou o coordenador pode apagar fisicamente o parágrafo (aquele que foi deletado virtualmente). A cada bloco poderão ser agregadas anotações, que não farão parte do texto, servindo apenas como comentários e observações sobre o conteúdo. Também é possível trabalhar com seções, que são divisões do documento; podem-se criar, unir, separar, mover, deletar seções, além de atribuir papéis diferentes para os integrantes do grupo de edição em cada seção, por exemplo, um determinado colaborador pode atuar como escritor em uma seção e como observador nas demais. Se houver necessidade, podem-se modificar essas regras ‘default’ para ajustar-se ao plano de atividade na construção coletiva de um documento.

 

7. Contribuição para a Educação

A utilização de uma ferramenta de produção coletiva de textos potencializa várias atividades na escola, possibilitando aos alunos descobrirem-se como autores em suas singularidades. Ao expressarem suas formas de pensar, encontrando eco em seus parceiros, poderão perceber uma riqueza interior, com efeitos sobre sua auto-estima e o modo de ver o mundo à sua volta. A reunião de diversos autores na construção coletiva de um documento pode levar a uma troca de experiências e de visões pessoais, favorecendo o encontro dialógico, base para a produção de sentidos na elaboração de um documento comum.
No caso de trabalhos envolvendo várias escolas, de lugares diferentes, há uma possibilidade maior de explorar as diferenças regionais e promover o acolhimento entre perspectivas culturais diversas. E aqui cabe destacar a importância da flexibilidade da ferramenta em permitir que o grupo de trabalho decida sobre a sua forma de atuar. A riqueza da utilização do EccoLogos vai depender das proposições que se façam, da motivação desencadeada e das descobertas dos atores neste cenário.

Tal atividade é desafiante sob todos os aspectos. Citando Albino [2001]:

Se antes existiam idéias isoladas escritas por uma única pessoa tida como um ente sagrado por sua capacidade de desenhar sinais, impondo sua vontade, seus pensamentos derivados tão somente de suas idéias, mesmo que tenham sido colhidas em meio a multidão, mas expressando sua interpretação dos fatos, agora existe a chance de criar “escrituras sagradas” feitas com o coletivo pensante dos grupos de trabalho. Não será mais alguém expressando suas idéias, mas suas idéias sendo expressas, alteradas, trabalhadas até constituírem um todo, completo e construído pelo trabalho do grupo, expressando todas as visões, todas as opiniões e também os consensos gerados das discussões, pois não há alguém impondo sua idéia, mas sim várias opiniões sendo analisadas para gerar a opinião transcendente que expresse o pensamento geral.

 

8. Conclusão

O trabalho em grupo apresenta complexidades provenientes das diversas formas de interação entre seus integrantes. Como cada grupo é um caso a parte, também, cada trabalho em grupo é um caso a parte. Disso surge a necessidade de desenvolver ferramentas que tenham flexibilidade no funcionamento para adequar-se a essas diferenças. Como não é possível agradar a todos, deve haver um equilíbrio entre a flexibilização e as linhas gerais de funcionamento do sistema. Com esta flexibilidade os usuários poderão, à medida que desenvolvem suas habilidades no uso da ferramenta, desenvolver diversas atividades de trabalho em grupo.

O EccoLogos ao buscar adotar uma interface amigável, ao deixar ao grupo decidir o conjunto de regras de funcionamento, ao possibilitar que certas coordenações entre os elementos da tarefa sejam registradas pelo sistema para regular o funcionamento da dinâmica de grupo, bem como assegurar direitos de autoria, se propõe a não só a auxiliar na tarefa de produção coletiva de documentos, mas ainda a facilitar a intercomunicação dos escritores/autores nas suas coordenações de ações. Em vista disso, um grande leque de experiências se abre à nossa frente, principalmente na sua utilização na Educação a Distância.

 


Notas
(1) http://equitext.pgie.ufrgs.br.
(2) A equilibração majorante refere-se à capacidade cognitiva de reorganização dos sistemas, no caso conceituais, alçando-os a um novo patamar de formalização, ampliando-os e tornando-os mais coerentes e coesos.[Piaget, 1976].
(3) http://www.civitas.lelic.ufrgs.br/forchat.
(4) O LELIC/UFRGS desenvolve através do referido projeto a plataforma AVENCCA, com vistas a abrigar ferramentas de apoio a Educação a Distância, entre as quais o Eccologos, sustentadas numa concepção teórico-metodológica que privilegia, dentre outros, a interação cooperativa e a autoria coletiva.


Bibliografia

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