A FORMAÇÃO DE TUTORES NA CÂMARA DOS DEPUTADOS E A PARCERIA GESTORES/INSTRUTORES

ABRIL/2004

 

Lúcio José Carlos Batista
Mestre em Educação pela Universidade de Brasília,
na área de concentração de Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico,
com especialização docente lato sensu em Executivo da Educação, pelo ICAT/UDF e
especializações lato sensu em Avaliação Institucional e Desenvolvimento Gerencial,
ambas pela UnB, graduado em Estudos Sociais, pela UPIS,
e funcionário da Câmara dos Deputados,
cursando especialização docente em Metodologia de Educação a distância, na UNISUL.

 

A – Formação de Profissionais para Educação a Distância
3 -Educação Corporativa

RESUMO
Trata-se de ensaio que aborda a formação de tutores que atuam nos cursos mediatizados por computador, na Câmara dos Deputados. A formação compreende um curso presencial de 45 horas e um acompanhamento por meio de uma parceria entre gestores do Núcleo de Educação a Distância e os tutores dos treinamentos. O curso proporciona uma reflexão sobre paradigmas, constituição de sujeito, educação, construção do conhecimento e a função social do Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Instituição. E o acompanhamento promove um ambiente de abertura dialógica que reflete em um aprimoramento de todo o processo de planejamento e desenvolvimento dos cursos, bem como no desenvolvimento das habilidades voltadas para a tecnologia. Ao relatar a experiência, constata-se que privilegiar a formação dos profissionais da educação tem se mostrado uma forma eficaz de se discutir sobre educação no ambiente cultural da organização e de se levar à constatação da necessidade de uma mudança da visão paradigmática da forma de agir na condução de processos educativos, com profundas resignificações sobre as relações tutor/aluno, tutor/gestor e aluno/aluno.

 


1. INTRODUÇÃO

A área de treinamento da Câmara dos Deputados foi instituída em 1971, inicialmente com o nome de Coordenação de Seleção e Treinamento, com a atribuição, entre outras, de promover o desenvolvimento dos servidores, por meio de cursos e treinamentos. Pela adequação metodológica vigente à época utilizou-se exclusivamente o ensino presencial, nas dependências da Casa ou em áreas externas, por meio de convênios com outras instituições.

Desde 1997, a Câmara dos Deputados, com a reestruturação da área de treinamento e a conseqüente criação do Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento – CEFOR, vem promovendo estudos, sistemáticos, sobre educação a distância. Inicialmente a proposta buscava acompanhar o desenvolvimento das modalidades educativas no país e no mundo, mas a partir da efetiva implantação do Núcleo de Educação a Distância - NUEAD, em 2001, na Coordenação de Treinamento, evidenciou-se o reconhecimento de que se trata de modalidade que vem ao encontro dos interesses organizacionais e que possibilita aos servidores de sua Instituição aprimorar-se continuamente com absoluta administração de seus horários de estudo e em seus ritmos individuais de aprendizagem.

No entanto, a Câmara dos Deputados traz em sua história a predominância do ensino presencial como alternativa de treinamento, com poucas e isoladas ações voltadas para a educação a distância, o que nos impossibilita falar sobre a formação de profissionais para a educação a distância, na Câmara, sem passar, ainda que superficialmente, pela formação dos instrutores do ensino presencial.
Sabe-se que, em um ambiente corporativo, como o da Câmara dos Deputados, a ação educativa envolve funcionários que detém os conhecimentos técnicos suficientes e necessários para a formação de outros profissionais das mesmas áreas ou de áreas afins, mas que nem sempre esses conhecimentos coincidem com uma preparação prévia de formação de profissionais da educação no meio acadêmico, e que, ainda, os trabalhos específicos da Instituição geram um conhecimento construído na própria cultura organizacional que faz com que funcionários de áreas diversas precisem ser utilizados como disseminadores de conhecimentos nos treinamentos da empresa. No caso, o Processo Legislativo é um bom exemplo desse tipo de construção do conhecimento, pois surge e é regulamentado no próprio ambiente da Instituição, sem que existam, no sistema educacional, cursos que possibilitem a formação desses profissionais.

A Coordenação Técnico-Pedagógica, em função do reconhecimento desses aspectos, há muito se preocupa com a formação de seus instrutores, promovendo um Programa de Desenvolvimento Pedagógico que tem por objetivo a formação de profissionais que possam ser selecionados para ações de treinamento na própria Câmara dos Deputados. Este programa envolve um curso sobre a Organização do Trabalho Pedagógico, com 45 horas, e outras iniciativas para proporcionar uma educação continuada, como palestras e encontros dirigidos para os instrutores que atuam no CEFOR. Assim, o Núcleo de Educação a Distância, em função do treinamento que já é desenvolvido para os instrutores do ensino presencial, já encontra, ao utilizar-se do corpo de instrutores do CEFOR para selecionar os que trabalharão com tutoria, espaço privilegiado com profissionais que já estão, de certa forma, adaptados às particularidades culturais educativas da Instituição.

No entanto, o Núcleo de Educação a Distância reconhece, ainda, as sutilezas que se fazem necessárias observar na transição de um modelo que utilizava prioritariamente o ensino presencial e que conta, agora, com tecnologia que permite a adoção da metodologia a distância, ou a oportunidade de um trabalho misto. E, em função disso, além de suas atividades em relação ao planejamento, acompanhamento ou desenvolvimento de cursos a distância e gestão dos cursos em andamento, o NUEAD privilegia, ainda, a formação dos servidores que atuam como tutores no acompanhamento desses cursos.

Objetiva-se com este espaço a divulgação desse trabalho de formação de tutores na área de educação a distância, no reconhecimento de que a publicidade de experiências diversas é o que nos faz construir conhecimentos que podem alicerçar decisões sobre formas de agir em uma modalidade de ensino que tem a aceitabilidade de sua eficácia e validade ainda muito recentes historicamente.

 

2. A FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS PARA A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO CEFOR

A formação dos profissionais para a educação a distância, no CEFOR, poderia ser divida em dois aspectos: quanto aos profissionais que trabalham no NUEAD, a Câmara dos Deputados mantém uma equipe capacitada academicamente, aperfeiçoada por meio de especializações e atualizada com participações em congressos e eventos correlatos aos assuntos de suas atribuições, e quanto aos tutores que atuarão junto à equipe do NUEAD, como especialistas em conteúdo ou no acompanhamento das turmas, o próprio NUEAD responsabiliza-se pela preparação, que, aqui, será objeto de exposição, na forma que se mostra.

A formação dos tutores para atuarem em educação a distância, na Câmara dos Deputados, pode ser dividida em três etapas distintas: a reflexão sobre a prática instituída; a construção de uma nova práxis; e a parceria gestor/tutor como forma de educação continuada para ambos os partícipes..

A reflexão sobre a prática instituída parte do pressuposto que o profissional da educação vem-se formando por toda a sua vida, em suas experiências de aprendizagens anteriores, o que possibilita que ele crie modelos que o farão atuar no ambiente de aprendizagem. Tardif (2002, p. 20) afirma que “antes mesmo de ensinarem, os futuros professores vivem na sala de aula e nas escolas – e, portanto, em seu futuro local de trabalho, durante aproximadamente dezesseis anos. Ora, tal imersão é necessariamente formadora (...) e esse saber herdado da experiência escolar anterior é muito forte, persiste através do tempo, e a formação universitária não consegue transformá-lo nem muito menos abalá-lo”. Isso faz com que a preocupação do NUEAD na formação de seus tutores não busque alcançar apenas os colaboradores que não tenham tido em sua formação acadêmica cursos de licenciatura, mas todos, pois mesmo os formados professores precisam adaptar-se aos princípios de construção de conhecimento que acredita o NUEAD e tornarem-se, assim, educadores na Instituição. Principalmente porque somos ainda de uma geração que privilegiou a ensino presencial durante nossa formação acadêmica.

Ao ver a educação como a forma em que o ser faz a cultura e se faz nela, o Núcleo de Educação a Distância traz para a construção do conhecimento o acoplamento estrutural de Maturana e Varela (2002, p. 112) em que o ser vivo constrói conhecimento em todas as suas relações com o outro e com o ambiente que o circunda e que o qual se relaciona. Essa visão reconhece que o homem, como nos propõe Paulo Freire (2002, p. 59), pode ser apenas condicionado pelo meio, jamais determinado, e que ele se constitui de forma autopoiética, seguindo ainda Maturana e Varela (1997, pp. 66-67) na busca constante do equilíbrio entre sua estrutura e organização. Por fim, acredita no sucessivo registro dos acontecimentos para a construção do conhecimento promovido por meio das relações sociais e da inserção na cultura, tornando-se dessa forma um ser que se constitui em sua individualidade, mas também influenciado pelo meio sócio-histórico-cultural.

Para possibilitar o surgimento de um instrutor que seja capaz de proporcionar um ambiente para que os participantes de um curso construam conhecimento, alicerçado em bases pedagógicas diferenciadas das que foi construindo no decorrer de sua vida no sistema educacional, naquele meio em que se inseria, faz-se necessária a reflexão que promova uma verdadeira transformação em sua concepções sobre educação e sobre o próprio homem, pois como nos disse Freire (2001, p. 27): “não é possível fazer uma reflexão sobre o que é a educação sem refletir sobre o próprio homem” e que temos que buscar encontrar na natureza do homem algo que possa constituir o núcleo fundamental onde se sustenta o processo da educação.

O NUEAD preocupa-se, primeiramente, em promover uma reflexão sobre paradigmas, pois é preciso, para que ocorra transformação, o reconhecimento de que paradigma é “um núcleo organizacional profundo que comanda e controla o uso da lógica, a articulação dos conceitos, a ordem dos discursos (MORIN, 2201, p. 22) e que, segundo Brandão (2002, p. 140) é o que nos faz ir da “língua que falamos ao amor que praticamos e da comida que comemos à filosofia de vida com que atribuímos sentidos ao mundo, à fala, ao amor, à comida, ao saber, à educação e a nós próprios”.

Busca-se a constatação dos instrutores em formação de que um paradigma se refere aos princípios que organizam o pensamento e as práticas, e que são invisíveis/inconscientes para os sujeitos (assim como as regras da linguagem). Eles são profundamente enraizados na nossa constituição de sujeitos sociais, fazem parte da nossa identidade e são muito difíceis de serem mudados, exige trabalho educativo integrado nas diversas dimensões do ser (física/emocional/racional/social/espiritual).

Adota-se, para as reflexões princípios da complexidade de Morin (2002, p. 182), sobretudo, os princípios: hologramático, de ir das partes para o todo e do todo para as partes; recursivo, em que os efeitos e produtos são organizadores das próprias causas que os fez surgir; e dialógico, que permite que unidades, aparentemente inconciliáveis e antagônicas, respeitem-se e se complementem.

Vinculada à reflexão do paradigma vigente, faz-se, também, um outro processo reflexivo, em que emerge a função social do órgão educativo, mais especificamente do CEFOR inserido no contexto da Câmara dos Deputados e na sociedade brasileira e mundial, por meio da discussão sobre os pares dialéticos propostos por Freitas (2001, pp. 94-97): objetivos/avaliação e conteúdo/método. É a reflexão sobre a função social do órgão educativo que faz com que os tutores se afastem dos conteúdos programáticos que estão acostumados a privilegiar e busquem observar os objetivos a que se propõe o treinamento, considerando, ainda, que, em ambientes diversos, esses objetivos, necessariamente, sofrem adaptações para alcançar a cultura organizacional em que estão inseridos para, assim, promover o indispensável diálogo entre o conhecimento e a realidade social em que será utilizado aquele conhecimento.

Torna-se possível, dessa forma, o reconhecimento do modelo em que fomos educados no sistema de ensino tradicional e que uma organização pode, e deve, exigir características próprias para o desenvolvimento de seus funcionários, não cabendo nela qualquer atitude, por parte dos tutores, de reprodução de modelos conteudistas, que objetivem a transmissão de conhecimento, pois os participantes reconhecem, por meio da reflexão sobre a educação, constituição do sujeito, aprendizagem e construção do conhecimento, que esta última se dá na interioridade e na subjetividade do sujeito, portanto, impossível de ser transferida a outro. Como diz Adell (apud FIORENTINI, 2003, p. 17): “não podemos transmitir conhecimento, só informação, que pode (ou não) ser convertida em conhecimento pelo receptor, em função de diversos fatores (os conhecimentos prévios do sujeito, a adequação da informação, sua estruturação etc.)”.

Há de se considerar, então, que o profissional da educação é o que tem a intenção de sistematizar a informação de modo a possibilitar que um outro, ao ler ou entrar em contato com tal sistematização, possa, a seu momento, construir o seu conhecimento, ou seja, os gestores e os tutores são responsáveis pela intencionalidade educativa que promove a ligação entre o conhecimento e o treinando e pela pelas relações do grupo: tutor/treinando e treinando/treinando, fazendo com que o conjunto dos conteúdos previstos para o treinamento alcancem uma estruturação de valores, objetivos e métodos que conduzam o processo de aprendizagem. O profissional da educação é o que faz a transposição didática, que como nos disse Chevallard (apud PAIS, 1999, pp. 16-17): transforma um objeto de saber a ensinar em um objeto de ensino.

Com a associação, pois, da impossibilidade de transmissão de conhecimento e da presença (mesmo que invisível) de um paradigma que representa a classe hegemônica, fica possível o acesso a uma construção de que a educação se dá por meio do acoplamento estrutural, ou seja, da relação do homem com o meio em que habita – tanto natural quanto humano.

Assim, aumenta o desafio do tutor porque se evidencia que o processo de construção do conhecimento não promove, necessariamente, mudanças comportamentais imediatas, pois as raízes paradigmáticas são profundas no ser humano, mas que os princípios já citados da complexidade: dialógico, hologramático e da recursividade viabilizam o processo de transformação social, principalmente, se associados à pedagogia da complexidade ambiental, difundida por Leff (2002), que tem como base o conhecimento da realidade social em que se inserem os partícipes do processo educativo e o respeito à outridade.

Há de se ressaltar que o grupo de tutores em formação é levado a refletir sobre comportamento e outridade. Para comportamento, partimos do registro de um trecho de Von Uexküll, citado por Jean-Didier Vicent, em Morin (2001, p. 182), de que “comportamento é uma melodia de movimentos cantados a duas vozes afinadas, a do sujeito que se comporta e a da situação”. Ou seja, o comportamento não é visto como uma ação isolada na pessoa, mas como um conjunto: é a relação do ser e as circunstâncias. E o aprender a ser com a outridade é imbricado na reconstrução de uma identidade nas condições do real e do simbólico, na alteridade, na diferença e na diversidade, como proposto por Leff (2003, p. 49) em que a “reconfiguração da identidade leva a indagar sobre os pontos de assentamento do ser coletivo em um território e de ancoragem na cultura [...] e que se complexiza em um processo de mestiçagem étnica e de mutações culturais, para constituir identidades inéditas”.

Aprofundam-se, ainda, as discussões sobre linguagem, interatividade e distâncias, sobretudo, as relacionais. Para a discussão sobre espaço e distâncias, adotamos Tori (2003, pp. 14-21), que ao falar sobre as várias distâncias da ação educativa, abordou a complexidade do termo distância, tendo em vista que os seres aprendentes podem se sentir próximos, ou não, independentemente do espaço geográfico que ocupam, direcionando o foco da discussão para outros aspectos que não a distância geográfica. O grupo discute a abordagem do autor sobre a distância transacional – os espaços psicológicos e comunicacionais a serem transpostos – ou seja, sobre o sentimento de proximidade ou de distanciamento, no processo de aprendizagem, e que é decorrente não apenas do afastamento geográfico entre os sujeitos, mas, também, da proximidade ou do distanciamento do ser aprendente e do que é estudado. Aqui, ainda, são considerados os aspectos subjetivos da constituição do sujeito – significado e sentido - e da aprendizagem, como: empatia, adequação da linguagem, formalidade, informalidade etc.

O trabalho de formação com os tutores considera que teoria e prática se fundem e que os tutores precisam ampliar suas competências em dimensões variadas. Rios (2001, pp. 89-97) apresentou as dimensões, a seu ver, necessárias a um professor competente: técnica, política, ética e estética. Por técnica a autora descreveu o domínio dos conteúdos de uma área específica e dos recursos necessários para a socialização das informações; por política, a capacidade de direcionar suas ações e comprometer-se com o alcance destas. Por ética, que apresentou como elemento mediador, a autora trouxe a necessidade de uma atitude crítica que indagasse sobre o fundamento e o sentido da construção de determinado conhecimento e, por fim, por estética, a percepção sensível da realidade, do contexto, do outro.

Assim, os tutores em formação são incentivados a fazer essa transposição do ensino presencial para o mediatizado pelo computador de forma gradual, ocasião em que recebem as orientações, individualmente, quanto ao uso da tecnologia e a aplicabilidade das discussões. A apresentação dos membros do grupo, por exemplo, é feita por e-mail e remetida a todos os participantes do grupo, mas em seguida se promove um encontro presencial em que os participantes recebem essas apresentações impressas para, aleatoriamente, identificarem os seus autores e falarem para eles o que sentiram em relação à apresentação que foi enviada. Eles são incentivados a abordarem em suas críticas os aspectos subjetivos que indicariam uma aproximação ou um distanciamento em função da linguagem utilizada e do conteúdo que constou na apresentação. Com isso é gerada uma oportunidade em que todos podem ouvir do outro as impressões à cerca de sua apresentação e permitir uma reflexão que contrasta a metodologia utilizada no treinamento e o paradigma em que foram acostumados.

Na relevância do respeito à realidade social em que se insere o treinando, os gestores e tutores de processo legislativo, por exemplo, que atendem as Assembléias Legislativas Estaduais são instigados a conduzirem a comunidade de aprendizagem colaborativa por meio de discussões sobre os próprios ambientes em que estão inseridos os partícipes. Apesar de o ambiente de aprendizagem apresentar o Curso de Processo Legislativo Institucional da Câmara dos Deputados, os participantes do grupo de aprendizagem trazem a realidade dos processos legislativos de seus estados para a discussão, proporcionando que o conhecimento se construa na relação complexa de realidades distintas, promovendo um diálogo de saberes locais, interestaduais e confrontado o escrito e o praticado nesses diversos ambientes.

É importante que se evidencie que o saber comum que surge nos grupos é um conhecimento que é construído sem a sistematização e a intencionalidade educativa presentes no sistema acadêmico e que não se consolida por meio da experimentação científica, mas que não pode ser visto com um saber sem sistematização, pois é sistematizado culturalmente e alicerçado na experimentação social, portanto, apenas construído de forma diferente do científico, mas tão válido quanto.

Ao se falar do uso da pedagogia da complexidade ambiental, também, convém que fique muito evidente que o termo ambiente não se refere às concepções de educação ambiental que foram construídas no decorrer do tempo como ações voltadas para o ambiente natural, mas como o estudo da realidade em seus aspectos econômicos, históricos e sociais, e que busca soluções para os problemas do meio ambiente, vendo meio ambiente não como espaço vegetativo, mas como o meio social, histórico, político e cultural em que estamos inseridos.

Essa pedagogia alicerça-se, sobretudo, na percepção de um mundo, que tem princípios que limitam a natureza e a cultura e, conforme Leff (2002), por um ser que é subjetivo, em um diálogo de saberes diversos – como os científicos e comuns – em uma forma de se aprender a ser sem a necessidade de se sobrepor ao outro.

A sociedade complexa que, hoje, habitamos, já exige uma postura do profissional de educação que adote uma complexização ambiental para a construção de conhecimentos significativos. E a educação a distância mostra níveis diferenciados de complexização ambiental em relação ao ensino presencial, pois os recursos utilizados apresentam-se diversos dos que nós seres aprendentes fomos acostumados. O uso de tecnologias de comunicação, como o computador, por exemplo, faz com que o participante de um treinamento tenha o ambiente histórico, social e cultural em que ele está inserido e ainda o ambiente de aprendizagem diferenciado do que ele estava acostumado no ensino presencial. Azevedo já abordou este assunto no texto “Muito Além do Jardim de Infância”.
Mas a realidade mostra ainda que esta é uma barreira para muitos dos que se habilitam a participar de cursos mediatizados por computador. E é por isso que o NUEAD, ao promover seus cursos a distância, atua com gestores da área educacional e tecnológica junto a esses profissionais que fizeram o curso de formação e que detém os conhecimentos específicos, mas que ainda não consolidaram uma visão paradigmática diferente das que foram educados, promovendo assim uma parceria entre tutores e gestores.

 

3. A PARCECIA TUTOR E GESTOR

Usualmente, no NUEAD, os gestores são membros de sua própria equipe, participam de todas as atividades da turma e se apresentam para os participantes do curso como os responsáveis pelos aspectos relacionados à tecnologia e à metodologia, enquanto o tutor é o responsável pela discussão do conteúdo.

Essa parceria tutor e gestor, no ambiente de aprendizagem, faz com que um esteja acompanhando as ações do outro em um clima de abertura para o processo dialógico que permite que sejam realizadas críticas que levarão ao aprimoramento do processo.

Há um acordo entre tutores e gestores que faz com que os e-mails direcionados a um sejam encaminhados ao outro, para conhecimento e acompanhamento do processo. Quando o período previsto para o curso chega ao fim, ambos – tutor e gestor – saem com o conhecimento de todos os procedimentos que foram adotados durante o processo de construção do conhecimento, levando a um crescimento ímpar, pois a discussão excede o conteúdo programático previsto e leva ambos à discussão dos procedimentos metodológicos adotados.

É essa parceria que permite que um tutor, como por exemplo um de processo legislativo de um curso, que ocorreu em abril, procure o gestor e diga, após um chat que teve um baixo número de participantes: “Vamos mudar o procedimento? Vamos tornar o chat um momento obrigatório para a avaliação? Se eles sentirem que precisam participar do chat para concluírem o curso e receberem certificados, eles entram”.

Esse comentário reacendeu toda uma discussão que já foi intensa durante o curso de formação de tutores de que toda e qualquer avaliação se preza, exclusivamente, à construção do conhecimento e ao aprimoramento do processo, não podendo se constituir em um fator opressor ou em um instrumento de poder para o tutor obrigar o treinando a participar de uma atividade que, por um motivo qualquer, inclusive cultural, ele ainda não está preparado.

Em outros momentos, como no caso do Curso de Oficina de Textos promovido em abril, diante da insegurança de uma instrutora em lidar com a tecnologia, em um momento de chat, ela foi convidada a estar presente no NUEAD e de lá conduzir o encontro síncrono. A simples presença da equipe do NUEAD na mesma sala e o uso de um dos nossos equipamentos fez com a que a instrutora atuasse de forma segura e desembaraçada diante do grupo. Trata-se, na realidade, do respeito aos limites do outro e à abertura para que cada uma das partes assuma perante a outra as suas limitações e possibilidades, inclusive culturais. É o processo dialógico que permite que o outro seja respeitado, inclusive, conhecido, em uma relação, como proposta por Freire (2001, p. 68), não verticalizada, mas horizontal de um com o outro que se nutre de “amor, de humanidade, de esperança, de fé, de confiança”. É uma relação em que ambos os sujeitos crescem no respeito à diferença, no respeito do que o outro é e expressa.

É com esse tipo de discussão que gestores e tutores têm buscado o real papel motivador que cabe a eles no acompanhamento dos cursos. E é com esse tipo de trabalho que o NUEAD tem recebido, após a conclusão dos cursos, e-mails de alunos que dizem que se habilitaram para participar das atividades sem a devida crença de que a metodologia fosse eficaz e que concluem o curso surpresos com a proximidade que foi atingida durante o processo.

Há momentos, como o curso de processo legislativo para as Assembléias Estaduais, que o gestor acompanha o desenvolvimento das construções do grupo, atuando como o animador da inteligência coletiva, proposto por Levy (1999, p. 171), e seguro quanto ao processo, pois conta com a participação de especialistas de conteúdo que participam do grupo. Esses participantes convidados foram tutores em outras turmas e o fato de estarem no papel de alunos faz com que seja um treinamento em serviço para a própria atividade de tutoria. De igual forma, apesar de sua condição momentânea de não-tutor, eles participam de todas as discussões metodológicas com o gestor.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho coletivo da equipe do NUEAD, do CEFOR, na Câmara dos Deputados, tem-se mostrado bastante eficaz na implantação da educação a distância na Instituição e a parceria entre gestores e tutores tem promovido uma aceitabilidade por parte da tutoria que os leva a um envolvimento contínuo e crescente nas atividades de treinamento que adotam o uso de metodologias de EAD.

Privilegiar a formação dos tutores tem se mostrado uma forma de se levar à necessidade da mudança paradigmática em que as concepções sobre educação, avaliação, construção do conhecimento, constituição do sujeito etc. sofrem profundas resignificações. E o acompanhamento das atividades tem mostrado que não se trata de uma ruptura com o ensino presencial, mas, ao contrário, de um fortalecimento de uma educação que se apresenta de formas diversas e que acompanha o desenvolvimento tecnológico e cultural do ambiente em que se insere a Instituição.

A aceitabilidade da metodologia por parte dos treinandos é crescente em função do sentimento de pertencimento dos tutores à equipe do NUEAD, pois os alunos expressam perceber o compromentimento dos instrutores com a equipe do NUEAD, que apenas essa parceria dialógica pode promover. E é esse sentimento que promove uma ampliação na própria discussão do planejamento e do acompanhamento das atividades do NUEAD.

Indubitavelmente, a experiência com a formação dos tutores não tem se revertido positivamente apenas para o uso do ambiente virtual de aprendizagem, pois tem promovido uma reflexão nos participantes, em relação às suas práticas educativas, que alcançam tanto o ensino mediatizado por computador, como o presencial. E mais ainda: tem promovido uma inserção natural de um ensino misto que concilia o presencial e os recursos da EAD.

E essa abertura dialógica tem se refletido entre os alunos, que observam a criticidade do outro como um fator de crescimento na aprendizagem colaborativa, sem o efeito pejorativo do desrespeito à diversidade.

Há de se considerar, por fim, que o processo avaliativo se dá por meio de toda e qualquer informação registrada, escrita ou oralmente, no decorrer do processo, pois o NUEAD vê a avaliação de conhecimento imbricada na própria construção do conhecimento, ou seja, como um importante recurso que possibilite novas construções de conhecimento, não cabendo em sua proposta metodológica avaliações classificatórias e excludentes, e quanto à avaliação da atividade, como recurso que possibilite o aprimoramento do processo educativo, voltada pois para a qualidade, tanto do processo quanto da aprendizagem. A relevância da avaliação, para o NUEAD, é o aperfeiçoamento constante de suas atividades e a construção de aprendizagem realmente significativas para os funcionários da Câmara dos Deputados.

 


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