Cacilda Almeida de Araújo
*
Professora da Secretaria de Educação do Estado da Bahia. Mestranda
do programa de Pós-graduação em Educação
e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia - UNEB.
E-mail: cacildaaraujo@atarde.com.br
Maria Sigmar Coutinho Passos
*
Professora da rede pública estadual, multiplicadora do NTE17- Salvador.
Mestranda do programa de Pós-graduação em Educação
e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia - UNEB.
E-mail: sigma@salvador.ba.gov.br
Tema: A- Formação de Profissionais para Educação
a Distância
Categoria: 2-Educação Universitária
RESUMO
O objetivo deste artigo é discutir e analisar as questões
referentes a educação a distância, numa perspectiva de formação
de comunidades de aprendizagem, a partir de uma experiência desenvolvida
no mestrado em Educação e Contemporaneidade da Universidade do
Estado da Bahia.
Palavras-chave:
Educação a distância – Comunidades de Aprendizagem
Contexto da EAD no Brasil
O ensino a distância no Brasil tem uma trajetória que precede a utilização dos recursos da telemática na educação: o ensino por correspondência, escolas radiofônicas, a Teleducação são exemplos desta modalidade. A regulamentação da Educação a Distância (EAD), entretanto, aconteceria apenas com a atual Lei de Diretrizes e Bases, “pela primeira vez, de maneira explícita e inquestionável, a EAD ganha, com a Lei 9.394, de dezembro de 96, o status de modalidade plenamente integrada ao sistema de ensino” (GARCIA, 2000, p.81). Essas experiências anteriores, contudo, partiram da mesma concepção de educação enquanto transmissão de informação e os recursos técnicos eram apenas meios, eficazes ou não, de fazer a informação chegar a um número maior de pessoas. Assim, para Nova e Alves (2003):
um dos grandes problemas desses cursos relacionava-se à quase que completa falta de interatividade do processo de aprendizagem, devido à dificuldade dos alunos de trocarem experiências e dúvidas com professores e colegas, o que desestimulava e empobrecia todo o processo educacional. Nesse sentido, a ênfase da aprendizagem centrava-se no autodidatismo.
Nas propostas estatais estava implícita a necessidade de corrigir as distorções e a falta de acesso à educação para a maioria da população, através de meios de comunicação de massa como rádio e TV. Mansur (2001), analisando o contexto latino americano, reforça esta idéia acrescentando que a necessidade de alfabetização em massa e de incorporação da população jovem ao mundo do trabalho impulsionou “a modalidade a distância, com certo grau de continuidade, a partir da década de 60, quando se desenvolvem projetos de alfabetização destinados a populações camponesas e rurais, dispersas geograficamente e afastadas dos centros urbanos” (MANSUR, 2001, p. 40).
Imaginava-se que tais distorções, consolidadas por um longo processo histórico de exclusão educacional, seriam resolvidas apenas com a utilização de diferentes suportes (rádio, impresso), sem uma reforma educacional que proporcionasse a inclusão numa escola de qualidade. Há o risco de que o mesmo aconteça com a educação a distância numa abordagem instrucionista. Por isso, faz-se necessário uma abordagem que tenha em vista também o contexto histórico de desenvolvimento da Educação a Distância no Brasil pois “essas marcas de origem muitas vezes determinam as possibilidades e as limitações dos projetos; apenas compreendendo isso é possível crescer, superar os obstáculos e avançar” (MANSUR, 2001, p.40)
Atualmente, educação a distância tem despertado o interesse de diversos setores da sociedade brasileira, tanto empresas particulares como instituições públicas, como pode ser visto pelo interesse do Ministério da Educação (MEC). As empresas buscam nessa modalidade a solução para a formação continuada e em serviço de seus empregados a um baixo custo, enquanto para o MEC surge como solução para as novas demandas de formação de professores nos termos da LDB 9394/96, artigos 52 e 62. Para entender a complexidade do problema é essencial analisar o que o governo entende por EAD, que sinalizará a sua utilização nas políticas públicas:
uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelo diversos meios de comunicação (Decreto 2494 de 10/02/1998).
O debate acerca da problemática que envolve a utilização da EAD na formação de profissionais ainda se encontra em aberto, mas já sinaliza alguns equívocos na forma de condução estatal ou privada deste processo. Várias experiências analisadas (Barreto, 2001; Toschi, 2001) demonstram que a utilização desta modalidade acontece ainda presa aos conceitos de currículo e aprendizagem que marcaram a pedagogia tradicional, esvaziando de significados a utilização das tecnologias na educação. Nesta perspectiva perde-se o que há de mais interessante na utilização das tecnologias na educação: a interatividade e a construção coletiva e cooperativa de conhecimentos.
A disciplina aqui analisada propôs outra abordagem para educação
a distância com a formação de uma comunidade de aprendizagem,
para discussão de diversos temas relacionados a EAD . Neste artigo iremos
resgatar os aspectos mais significativos.
Basicamente, as comunidades de aprendizagem assumem que o ser humano está
sempre em processo educativo, na medida em que está sempre trabalhando
com a resolução de problemas de sua existência, construindo
conhecimento e solucionando a práxis de seu dia a dia. Considerar este
tipo de abordagem é compreender também que todo processo educativo
é social e coletivo, e que cada procedimento pedagógico só
pode ser realizado colaborativamente, e legitimamente, em situações
organizadas para que o coletivo de professor e estudantes possam realizar a
construção da resolução de problemas em meio à
convivência social e em contexto. Esta perspectiva está na base
da concepção da Disciplina Educação a Distância,
do Mestrado em Educação e Contemporaneidades da UNEB.
Comunidade UNEB-EAD
O desenvolvimento da Educação a distância no currículo formal depende da posição do MEC/SEED em relação a esta modalidade e a legislação vigente já apresenta alguns avanços. Assim, a Portaria n° 2.253 de 2001 autoriza as instituições de ensino superior a oferecerem disciplinas semi-presenciais ou totalmente a distância, não excedendo 20 por cento do tempo do currículo.
A disciplina Educação a distância fez parte do programa de Mestrado em Educação e Contemporaneidades da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) como disciplina optativa, sendo oferecidas vagas para alunos regulares e especiais. Foi utilizado como principal ambiente EAD o Claroline disponibilizado pela Escola do Futuro - USP. Foram matriculados 19 alunos e destes 11 concluíram a disciplina.
Um dos problemas apontados pelos cursistas no percurso da disciplina foi a dificuldade para acessar o ambiente, relatada em muitos e-mails enviados a lista de discussão, onde tal dificuldade era um entrave para vários alunos. Como resultado, alguns alunos desistiram por não consegui interagir com o ambiente EAD da disciplina.
Desenvolvendo EAD na comunidade
A metodologia, os temas e a proposta pedagógica foram apresentados e discutidos no primeiro dia da disciplina num encontro presencial entre o professor e os alunos matriculados. Foi ressaltada a concepção sócio-construtivista que orientaria o desenvolvimento da disciplina, distinguindo-a de outras propostas instrucionistas. Tal proposta está em sintonia com autores como Jonassen (1996) que acentua que o desenvolvimento e aperfeiçoamento de várias ferramentas da informática ampliaram as opções de utilização construtivista, tendo possibilidades como: simulação, hipermídias, internet, multimídia etc. É necessário, segundo este autor, que um ambiente de educação à distância deva ir além de um ambiente instrucional ligado a Internet, com a utilização e articulação de diversas ferramentas que possibilite melhor nível de interatividade do ambiente, dentro de uma proposta de aprendizagem construtivista. Foi demonstrado com a disciplina que esta perspectiva não exige maiores investimentos em recursos humanos e técnicos, podendo ser desenvolvidas comunidades de aprendizagem em ambientes gratuitos como o Claronline e outros disponíveis na Internet.
Visando uma caracterização da EAD que privilegie a construção
coletiva de conhecimento em comunidades de aprendizagem, Matta propõe,
inicialmente, a seguinte classificação dos ambientes que compõe
a EAD: Ambientes de apoio à interação dos sujeitos participantes;
Ambientes de mediação e construção do processo de
ensino-aprendizagem; Ambientes de trabalho e autoria coletiva; Ambientes de
interação em tempo real ou on line; Ambientes diversos complementares
e facilitadores dos processos. O autor considera que entre estes ambientes alguns
podem ser considerados essenciais, outros recomendáveis e restante complementares.
Esta classificação tem, segundo Matta, o objetivo de melhor avaliar,
a partir da prática social dos atores envolvidos, o que realmente caracterizaria
a modalidade de Educação a Distância, para além da
simples utilização de diversas mídias e da comunicação
em rede.
Foi possível testar tal categorização durante a disciplina,
tendo as constatações a seguir. O Fórum se constituiu enquanto
espaço privilegiado para discussão dos temas essencialmente pela
sua característica de assincronia e armazenamento que permitia a interação
dos estudantes em diferentes momentos e o acesso fácil às opiniões
dos participantes; mesmo quando houve problemas de acesso ao ambiente e apenas
a lista de discussão estava disponível; as tentativas de manter
a discussão na lista foram em vão. Ao ser criado um ambiente de
fórum em outro sistema, as discussões voltaram a acontecer até
a normalização do acesso ao ambiente oficial da disciplina. A
participação neste ambiente foi, inclusive, o parâmetro
para avaliação dos alunos na disciplina.
O ambiente para interação on line (chat) classificado como recomendável mas não essencial numa comunidade de aprendizagem em EAD por Matta (2003), foi pouco utilizado durante a disciplina e não se constituiu enquanto espaço de troca de saberes, principalmente pela incompatibilidade de horário dos alunos e do professor.
Ainda faz-se necessário a avaliação mais detalhada e profunda das diversas experiências em EAD para consolidação de critérios mais significativos na avaliação desta modalidade.
Os conteúdos discutidos
O objetivo principal da disciplina era discutir temas relacionados a EAD utilizando para isso um sistema EAD. Durante a primeira aula, foi acordado que cada aluno ficaria responsável por fazer as provocações em cada tema. Os temas propostos foram:
Tema 1 - Ambientes EAD
Tema 2 - Comunidades de Aprendizagem
Tema 3 - Processo Cognitivo (parte 1) e (parte 2)
Tema 4 - Abordagens Pedagógicas (discutir tutoria)
Tema 5 - Interpretações das NT e EAD
Tema 6 - Professor e EAD
Tema 7 - Avaliação em EAD
Tema 8 - EAD e institucionalidade
Tema 9 - Sociedade atual - Pós Modernidade X Super Imperialismo
Para cada tema foram disponibilizados textos digitalizados na biblioteca do curso. Ao longo da disciplina tornou-se marcante as discussões sobre a base pedagógica que orienta os cursos na modalidade EAD, o papel do professor na educação a distância e a perspectiva de formação de comunidades de aprendizagem utilizando sistemas EAD. Nessas discussões ficou demonstrada a necessidade de que os projetos e cursos em EAD privilegiem o diálogo e a interatividade entre os sujeitos envolvidos.
A interação na comunidade de aprendizagem
Durante o desenvolvimento dos trabalhos o diálogo a partir das discussões propostas foi condição essencial para a formação da comunidade colaborativa. A partir do questionamento dos responsáveis por cada tema surgiram significativos debates numa perspectiva sócio-construtivista que permitiram aos sujeitos envolvidos apropriar-se dos temas pertinentes ao debate em educação a distância.
Nesse sentido, papel importante tem o professor na mediação da
aprendizagem. Conforme Rena Palloff e Keith Prant (2002:150):
"É importante que o professor seja capaz de facilitar esse diálogo sem dominá-lo, permitindo que "a torrente de pontos de vista" ocorra. Isso pode ser feito de várias maneiras. Primeiro, os docentes e os participantes devem aprender a desenvolver a arte de fazer perguntas inteligentes. A seguir, a responsabilidade por facilitar a discussão pode ser dividida com os participantes. Por último, os alunos devem ser estimulados - e mesmo solicitados - a comentar o desempenho dos colegas ao longo do curso."
A experiência em EAD promovida por essa disciplina permitiu esse diálogo como questionamento sugerido pelos autores solicitados, fazendo-nos perceber a mudança de atitude do professor na educação a distância nas comunidades de aprendizagem, que atuam como facilitadores do processo de ensino-aprendizagem.
Para os alunos do curso, o diálogo pôde ser desenvolvido tornado-se factível que pensemos numa educação sócio-construtivista, emergindo das comunidades em EAD, significando possibilidades reveladoras de uma educação que possibilite a interatividade na educação contemporânea.
Conclusão
A perspectiva de formação de comunidades de aprendizagem para a educação contemporânea deve constituir-se num fazer pedagógico que nos permita vivenciar nos cursos de mestrado em educação, esse reinventar a sala de aula a partir de uma virtualidade concreta que se dá diante da concepção sócio-construtivista em educação.
O mestrado em Educação e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia, através dessa disciplina, vem reafirmar sua tendência para debater assuntos que diz respeito a nossa historicidade, na qual somos sujeitos atuantes na promoção de uma educação que vise participação da sociedade nas questões que urgem no nosso cotidiano.
Pensar em educação a distância, é refletir nas possibilidades de diálogo que a mediação nas comunidades de aprendizagem permitem aos sujeitos sociais, contribuindo para a inserção de fazeres e práticas que se constituirão no ensino-aprendizagem que vislumbramos para o homem contemporâneo.
Otimizar comunidades de aprendizagem, se apresentaram a nós, envolvidos na experiência, a oportunidade de conceber um ensino a partir de EAD necessário para a construção de uma sociedade onde o diálogo é condição primeira para a apropriação de temáticas que emergem de nossa contemporaneidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Lynn; NOVA, Cristiane. Educação à Distância:
Limites e Possibilidades. In: _______Educação a distância:
uma nova concepção de aprendizado e interatividade. São
Paulo: Futura, 2003, p. 5-27.
BARRETO, Raquel. As políticas de formação de professores:
novas tecnologias e educação a distância. In: _______. Tecnologias
educacionais e educação a distância: avaliando políticas
e práticas. Rio de Janeiro: Ed. Quartet. 2001, p. 10-28.
BRASIL/MEC/SEED. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Brasília, MEC, dez./1996.
BRASIL/MEC/SEED. Decreto nº 2.494. Brasília, MEC, fev./1998.
GARCIA, Walter E. A regulamentação da Educação e
Distância no Contexto Educacional Brasileiro. In: PRETI, Oreste (org.).
Educação a Distância: construindo significados. Cuiabá:
NEAD/IE-UFMT; Brasília: Plano, 2000, p. 79-88.
JONASSEN, David. O uso das novas tecnologias na educação à
distância e a aprendizagem construtiva. Em aberto, Brasília, ano
16, n. 70, abr/jun. 1996.
MANSUR, Anahí. A Gestão na Educação a Distância:
Novas Propostas, Novas Questões. In: LITWIN, Edith (org.). Educação
a Distância: temas para o debate de uma nova agenda educativa. Porto Alegre:
Artemed Editora, 2001, p.39-52.
MATTA, Alfredo Eurico Rodrigues. Comunidades em rede de computadores: abordagem
para a educação a distância - EAD acessível a todos.
Disponível em <http://www.abed.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?serActiveTemplate=1por&infoid=724&sid=69>.
Acesso em: 20 de jun 2003
PALLOFF, Rena M.; PRANT, Keith. Estimulando a aprendizagem colaborativa. In:
_______ Construindo comunidades de aprendizagem no ciberespaço. Trad.
Vinicius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2002, p. 150.
TOSCHI, Mirza Seabra. TV Escola: o lugar dos professores na política
de formação docente. In: BARRETO, Raquel (org). Tecnologias educacionais
e educação a distância: avaliando políticas e práticas.
Rio de Janeiro: Ed. Quartet. 2001, p.85-104.
Maria Sigmar Coutinho Passos
Professora da rede pública estadual, multiplicadora do NTE17- Salvador.
Licenciada em História, especialista em Potenciais da Imagem (UFBA) e
em Telemática na Educação (UFRPE/Proinfo). Mestranda do
programa de Pós-graduação em Educação e Contemporaneidade
da Universidade do Estado da Bahia - UNEB. E-mail: sigma@salvador.ba.gov.br
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