MEIOS ELETRÔNICOS, VÍNCULO E  DISTÂNCIA TRANSACIONAL

Abril/2004

 

ULISSES SAMPAIO CASTRO
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
sampaio.castro@secrel.com.br

ELIAN DE CASTRO MACHADO, PhD
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
elian@ufc.br

 

A- Formação de Profissionais para Educação a Distância
2. Educação Universitária

RESUMO:
O surgimento e desenvolvimento das comunidades virtuais trouxe novas perspectivas para o estudo das relações entre as pessoas e suas conseqüências para os grupos humanos, seja no plano educacional, afetivo, profissional ou até mesmo religioso. O estudo desse novo contexto de relações e suas decorrências para as antigas formas de relacionamento humano pode -  e acredito que deve -  ser feito à luz de uma abordagem sistêmica.
A rede social pessoal de um indivíduo contribui para a própria identificação do sujeito e desempenha diversas funções em sua vida e é uma das fontes de conhecimento onde o sujeito busca seus saberes.
O estudo do papel dos  vínculos que se estabelecem entre as pessoas em ambientes virtuais pode lançar luz sobre questões ligadas à comunicação e principalmente à aprendizagem via meios eletrônicos.
 A medida da distância em educação transcende o mundo físico e ganha nova dimensão com o conceito de distância transacional.
O estreitamento dos vínculos que o aprendiz desenvolve com quem ensina e com os materiais de estudo podem ajudar a reduzir a distância transacional e a melhorar o entendimento das condições em que ocorre a aprendizagem em educação à distância.

PALAVRAS-CHAVE:
rede social, abordagem sistêmica, distância transacional, vínculo, educação a distância

 


1. ABORDAGEM SISTÊMICA, REDE SOCIAL E VÍNCULOS.

O surgimento e desenvolvimento das comunidades virtuais trouxe novas perspectivas para o estudo das relações entre as pessoas e suas conseqüências para os grupos humanos, seja no plano educacional, afetivo, profissional ou até mesmo religioso. O estudo desse novo contexto de relações e suas decorrências para as antigas formas de relacionamento humano pode -  e acredito que deve -  ser feito à luz de uma abordagem sistêmica.

Numa abordagem sistêmica, as fronteiras do indivíduo não estão limitadas por sua pele mas incluem tudo aquilo com que o sujeito interage. As fronteiras do sistema significativo do indivíduo não se limitam à família nuclear ou extensa, mas incluem todo o conjunto de vínculos interpessoais do sujeito: família, escola, amigos, trabalho... Nesse ponto, surgem algumas questões:

Para pensar acerca desses questionamentos, devemos nos deter com mais atenção na descrição do sistema de redes em que estamos inseridos. A rede social pessoal pode ser definida como a soma de todas as relações que um indivíduo percebe como significativas ou diferenciadas da massa anônima da sociedade. Ela contribui para a própria identificação do sujeito e para sua auto-imagem.

Em  (SLUZKI – 1997, p. 39)  encontramos um diagrama que ilustra bem o emaranhado de redes relacionais que cercam um sujeito.

Caixa de texto: Fig. 1: sistema de redes sociais .                    Fonte: SLUZKI – 1997, p. 39

Neste esquema, a rede (1) refere-se à rede social do indivíduo. As relações mais próximas ficam nos círculos menores, as mais distantes, nos maiores. As redes do tipo (2), pertencem a um dos membros periféricos da rede do indivíduo e onde ele é também membro periférico. Em (3) temos os contatos mais distantes, que compartilham uma realidade comum (um clube, por exemplo), mas que os membros não necessariamente se conhecem entre si. As redes do tipo (4) são aquelas onde o indivíduo não é membro, mas algum dos elementos de sua rede pessoal o é. As do tipo (5) são aquelas às quais o indivíduo pertence, porém, poucos membros de sua rede pertencem e as do tipo (6), são as que nem o indivíduo, nem os membros de sua rede fazem parte mas cujos eventos podem de alguma forma refletir sobre a teia social do sujeito.

Convém notar que no plano da rede social do sujeito as relações não  ficam estáticas. As relações são dinâmicas e os vínculos a todo o momento podem ser estreitados, afrouxados ou até mesmo desfeitos por conta da dinâmica das interações sociais.

 

1.2. CARACTERÍSTICAS ESTRUTURAIS DE UMA REDE

Em (SLUZKI – 1997, p. 45)  podemos encontrar uma enumeração das características estruturais de uma rede pessoal: tamanho, densidade, distribuição, dispersão, homogeneidade, tipos de funções.

O tamanho refere-se ao número de pessoas que compõem a rede. Redes de tamanho médio tendem a ser mais efetivas que as grandes ou que as demasiado pequenas. Nas grandes há um sentimento de delegação de responsabilidades (“alguém vai cuidar disso”), ao passo que nas pequenas há uma sobrecarga de responsabilidades em cada um dos membros quando se instala uma crise.

A densidade diz respeito à conexão entre os membros independentemente do elemento central, na qual uma densidade média se faz mais efetiva. Densidades muito altas tendem a enrijecer as relações e pressionar os indivíduos a uma adaptação às regras do grupo, sob risco de exclusão. Nas muito baixas não há o efeito potencializador do cotejamento das mensagens.

Entende-se por composição ou distribuição a proporção dos membros da rede em cada quadrante e em cada círculo.  Quanto mais ampla e heterogênea a rede, mais efetiva ela se torna. Redes muito localizadas representam um número menor de possibilidades. Vale ressalvar que redes muito amplas mas homogêneas tendem à inércia, à pequena capacidade de reação.

A dispersão é a distância geográfica entre os membros que alguns autores preferem trocar por acessibilidade. O fator distância geográfica está perdendo seu significado ante ao avanço dos meios de comunicação e de telepresença. Nesse ponto, os meios eletrônicos propiciam a criação de redes sociais amplamente distribuídas geograficamente porém muito reativas e sensíveis.

Homogeneidade é a composição por sexo, idade, credo, nível sócio-econômico, grau de instrução. A pluralidade em geral é benéfica mas pode, por outro lado, gerar tensões entre os subgrupos e interesses dentro da rede.

Os tipos de funções  são respeitantes aos papéis que a rede exerce na vida do sujeito. Numa lista sucinta podemos citar: companhia social, apoio emocional, guia cognitivo e de conselhos, regulação social, ajuda material e de serviços e acesso a novos contatos.

1.3. FUNÇÕES DA REDE

Segundo (SLUZKI – 1997, p. 48) algumas das funções da rede social seriam:

Companhia social – refere-se à realização de atividades conjuntas ou simplesmente o estar juntos. Não implica necessariamente em um maior comprometimento emocional ou intimidade. Poderíamos incluir nesse rol um contato na Internet com quem conversamos ou jogamos com alguma freqüência.

Apoio emocional – envolve empatia, compreensão, afinidades, estímulo e apoio. Comum em amizades íntimas e familiares próximos. Pode–se observar em comunicadores síncronos (messengers, icq, irc) a mudança do nickname conforme o estado de espírito do sujeito. Freqüentemente se observa o uso desse expediente pelos usuários, o que indica uma busca de empatia com seu momento de vida ou simplesmente uma vontade de exteriorizar sentimentos, comunicar. De minha experiência pessoal nesse campo, tenho observado que uma mudança no meu nickname sempre suscita comentários, interesse genuíno pelo porquê da frase ou simplesmente curiosidade. De qualquer modo, provoca um movimento do outro ao meu encontro.

Guia cognitivo e de conselhos – contatos destinados à troca de informações e esclarecimentos.

Regulação social – servem par reafirmar responsabilidades e papéis. Neutralizam desvios que tendam a afastar o sujeito do padrão esperado pelo grupo.

Ajuda material  e de serviços – colaboração específica de especialistas (um médico, por exemplo) ou ajuda física (um empréstimo).

Acesso a novos contatos – abertura de portas e de novas redes às quais não se tinha acesso. Esse traço existe potencialmente (ou virtualmente, segundo LÉVY - 1999) em qualquer relação mas aparece como traço marcante em algumas. Os especialistas em recursos humanos têm apontado esse tipo de interação como uma importante ferramenta de recolocação profissional.

Importante se faz salientar que a estabilização das funções dos vínculos se dá pela sua reiteração bem sucedida. A estabilização e confiabilidade dos vínculos resulta de uma combinação de funções.

 

2. O VÍNCULO E SEUS ATRIBUTOS

Acerca da definição de vínculo, Enrique Pichón-Riviére nos diz:

“... a maneira particular pela qual cada indivíduo se relaciona com outro ou outros, criando uma estrutura particular a cada caso e a cada momento,  que chamamos de vínculo”.  (PICHÓN-RIVIÉRE -1998, p. 3).

Vínculo pode ser definido como uma estrutura complexa que inclui um sujeito, um objeto, e sua mútua interelação com processos de comunicação e aprendizagem.(PICHON - 1988)

Ao elaborar a teoria do vínculo, Pichon a diferencia da teoria das relações de objeto concebida pela Psicanálise (que descreve as possíveis relações de um sujeito com o objeto sem levar em conta a volta do objeto sobre o sujeito, isto é, uma relação linear), propondo, então, o estudo da relação como uma espiral dialética onde tanto o sujeito como o objeto se realimentam mutuamente.

Um vínculo pode ser normal ou patológico. Considera-se normal quando o sujeito não alimenta relação de dependência com o objeto do vínculo nem ele em relação ao sujeito. Há uma livre eleição de objeto e ambos encontram-se diferenciados: nenhum dos dois pólos toma o outro como parte integrante de si mesmo.

O vínculo patológico ocorre na contra-mão do que foi dito no parágrafo anterior. Ele pode ser, dentre outros: paranóico, depressivo, hipocondríaco, histérico, esquizofrênico, maníaco... O estudo e detalhamento de cada uma dessas categorias fugiria ao escopo do presente trabalho.

A análise de um vínculo é feita com base em seus atributos, quais sejam: a função predominante, a multidimensionalidade, a reciprocidade, a intensidade, a freqüência dos contatos e a sua história.

A função (ou funções) predominante  caracteriza um vínculo e a multidimensionalidade  diz quantas funções um dado vínculo desempenha na vida do sujeito.

A reciprocidade, aqui, pode ser entendida como simetria. Você desempenha funções equivalentes às que aquela pessoa desempenha para você? Devemos observar que este é um atributo bastante difícil. Esse tipo de vínculo é mais factível entre pares. Pais e filhos começam com relações bastante assimétricas, que tendem a um equilíbrio na idade adulta dos filhos e podem se inverter se os pais se tornam idosos fragilizados. Também podemos citar professores e alunos que são sujeitos em momentos epistemológicos bastante distintos com expectativas diferentes na relação, por isso tendem a desenvolver relações vinculares bastante assimétricas.

A intensidade diz sobre o compromisso com a relação; quão mobilizável é este vínculo enquanto a freqüência de contatos mede a constância na manutenção da relação.

Por último temos a história; o grau de expectativa e confiança que depositamos em um vínculo depende muito da maneira como ele foi estabelecido e das experiências anteriores de ativação do mesmo.

 

3. TEORIA DA DISTÂNCIA TRANSACIONAL

Para definir distância transacional, precisamos antes definir o que seria transação. Esta última denota a interação entre o ambiente, os indivíduos e os padrões de comportamento numa dada situação (BOYD e APPS -1980, p.5).

Paralelamente, educação a distância, é entendida no presente trabalho como mais do que uma maneira de instruir, um conceito pedagógico que descreve o universo de relações professor-aluno que se dão quando alunos e instrutores estão separados no espaço e/ou no tempo.

Sintetizando os dois conceitos num único, poderíamos dizer que EaD  é uma transação que ocorre entre professores e alunos num ambiente caracterizado pela distância física entre alunos e professores. A separação conduz a padrões especiais de comportamento de alunos e professores. Afeta profundamente tanto o ensino quanto a aprendizagem.

Nesse contexto, distância transacional seria o  espaço psicológico e comunicacional a ser transposto; um espaço de potenciais mal-entendidos entre as intervenções do instrutor e as do aluno. Fica mais evidente com a separação física, apesar de não ser gerada por ela.

A seguir temos uma sucinta retrospectiva da evolução do conceito de EaD e o papel da distância transacional. Segundo MOORE (Apud BELLONI – 1999):

Ainda, segundo Michael G. Moore os cursos de EaD devem promover a autonomia do aluno durante a aprendizagem. Processo interno de apropriação a ser desenvolvido de forma dialógica, construída progressivamente por meio de questionamentos e de reformulações que exigem mediação pelo diálogo. Nesse ponto pode-se fazer um questionamento: não seria esse o objetivo a ser perseguido pela educação como um todo, fosse ela presencial ou a distância?

3.1. DISTÂNCIA EM EAD

A distância geográfica foi relativizada pelo avanço tecnológico dos meios de transporte e comunicação. A distância física deixou de ser um condicionante para as relações humanas. Pode-se estar fisicamente distante mas relacionalmente próximo.

A EaD amplia novamente o espaço de aprendizagem. A escola passa a ser o agente sistematizador dos conhecimentos. Moore compreende a distância não como obstáculo, mas como oportunidade a ser explorada.

O gráfico a seguir ilustra como se comportam as principais formas de educação quanto à flexibilidade e nível de diálogo.

A amplitude da distância transacional se mede pela presença/ausência de diálogo. No quadrante inferior esquerdo temos a educação formal tal como ocorre em nossas escolas. Os programas e currículos engessam o processo, que deve seguir uma padronização e levar a resultados homogêneos e previsíveis. É o fordismo levado a efeito na educação. Num contexto dessa natureza, um alto nível de diálogo poderia ser altamente deletério aos objetivos traçados pela instituição.

No quadrante superior direito, apresentando os maiores níveis de diálogo e flexibilidade, temos a aprendizagem colaborativa. Esta apresenta o maior índice de autonomia em contraposição ao curso formal, que leva a uma menor autonomia, ou seja, mais heteronomia.

 

4. A COMUNICAÇÃO MEDIADA POR COMPUTADOR

A comunicação mediada por computador possibilitou uma comunicação muito mais rápida, intensa e eficiente, e introduziu um grande número de novos recursos, provendo um maior enriquecimento nas comunicações. De acordo com Lohuis (apud OTSUKA, 1999), a Comunicação Mediada por Computador é qualquer sistema capaz de apresentar e/ou transportar informações de um computador para uma pessoa ou de pessoa para pessoa através dos computadores.

Vygotsky  vai buscar no materialismo histórico  dialético de Marx e Engels a inspiração e as ferramentas de sua teoria. Nela, o instrumento (e o computador pode ser considerado um) aparece como elemento intermediário entre o trabalhador e sua tarefa e que amplia suas possibilidades de transformação da natureza, portanto um elemento mediador da relação entre o indivíduo e o mundo, onde há outros indivíduos para serem conectados.

“... a pessoa que lê não está se relacionando com uma folha de celulose, ela está em contato com um discurso, um voz, um universo de significados...” (LÉVY - 1999, p. 164).

         Na teoria sócio-interacionista, o signo é o instrumento psicológico que amplia as possibilidades mentais do indivíduo, porém com uma diferença: os instrumentos de trabalho são orientados para o mundo exterior, modificam a natureza real ao passo  que os signos estão orientados para dentro do indivíduo e modificam e/ou controlam sua ação psicológica. A mediação é fundamental para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores (intenção, planejamento, premeditação)  que nos distinguem dos outros animais.

Os sistemas de representação da realidade são fornecidos pela cultura. O grupo cultural, a rede social,  fornece um ambiente estruturado onde os elementos estão carregados de significado. Entretanto, o indivíduo não os recebe passivamente. A relação é dialética. A internalização dos conceitos é um processo de síntese e de apropriação que o indivíduo faz dos elementos culturais.

Do mesmo modo que a educação que damos tende a reproduzir a que recebemos, o uso do computador no ensino tende a reproduzir as formas de ensino tradicionais. O seu uso não necessariamente rompe paradigmas em direção a uma real modernidade. Não obstante, juntamente com o questionamento do papel do professor e da escola no processo ensino-aprendizagem surgem novas formas de utilização do computador. Convém notar que ambas as formas de uso do computador continuarão coexistindo assim como as antigas e novas correntes educacionais.

“Ao contrário do que nos leva a crer a vulgata midiática sobre a pretensa frieza do ciberespaço, as redes digitais interativas são fontes potentes de personalização ou de encarnação do conhecimento”.(LÉVY - 1999, p. 162).

A função do professor como armazenador e repassador de conteúdos será rapidamente superada com vantagens pelo computador, deixando aos mestres de carne e osso a função da qual nunca deveriam ter se afastado: a de criadores de situações de aprendizagem, a de facilitadores de situações de desenvolvimento de habilidades e competências.

 

5. VÍNCULO, DISTÂNCIA TRANSACIONAL E APRENDIZAGEM: CONSIDERAÇÕES FINAIS.

O foco central de toda discussão sobre educação deveria ser a aprendizagem. Devido às heranças do behaviorismo e do tecnicismo, ainda persiste a preocupação com “as formas eficientes de ensinar” em oposição ao objetivo principal que seria aprender. Não seria mais lógico buscarmos formas mais eficientes de aprender?

A aprendizagem é um movimento interno que o sujeito faz em direção ao objeto de aprendizagem na tentativa de assimilá-lo.

“Assimilar  significa incorporar cognitivamente os objetos e esta absorção se realiza em conformidade a estrutura organizacional presente no estágio de evolução intelectual em que se encontra o indivíduo”.(GARAKIS-1998, p.22).

Malgrado a aprendizagem ocorrer internamente, ela ocorre em sociedade. A teia social do sujeito que aprende desempenha papel fundamental nesse processo. Ela é quem fornece os referenciais, as expectativas, os objetivos e os valores culturais que nortearão não só a aprendizagem mas a vida do sujeito aprendiz.

“    Sem postular um determinismo histórico, mas sem ter de recorrer a uma entidade extramaterial como o “livre-arbítrio”, Vygotsky estabelece que o indivíduo interioriza formas de funcionamento psicológico  dadas culturalmente mas, ao tomar posse delas, torna-as suas e as utiliza como instrumentos pessoais de pensamento e ação no mundo.” (LA TAILLE – 1992, p. 106)

Para educar, para que ocorra um processo ensino-aprendizagem, a distância transacional entre os atores no processo deve ser encurtada, o vínculo estabelecido precisa ser estreitado. O ensinante precisa entrar no mapa da rede social do sujeito que aprende e mover-se no sentido do estreitamento do laço, do vínculo. Nesse ponto podemos ouvir o que nos diz Rubem Alves:

“ Ensinar é igualzinho a cozinhar. O professor é um chef que prepara e serve refeições de palavras a seus alunos. [...] A ciência da educação não faz um professor, da mesma forma como o conhecimento da ciência do piano não faz um pianista” (ALVES – 1999 p. 38, 39).

Mas não haveria o risco do desenvolvimento de formas patológicas de vínculo? Sempre há. Em qualquer relação entre seres animados ou até com um objeto inanimado. É o ônus da vida em sociedade. Estamos sempre sujeitos a desenvolver formas não muito saudáveis de relação. Entretanto isso não serve como desculpa para o isolamento, sobretudo para quem se propõe a ensinar. Não é à toa que ensinar envolve um grande desgaste emocional. Ensinar exige envolvimento.

Analisando sob essa ótica, vemos um obstáculo para aqueles que acreditam numa educação emocionalmente neutra, homogênea e massificada. Como poderíamos massificar sentimentos, vínculos, motivações? Como padronizar materiais e formas de ensinar se não se pode contar com um aprendiz-tipo; padronizado, homogêneo, uniforme em suas reações?

Esses questionamentos devem preocupar todos os que pretendam educar e, mais ainda, os que se proponham educar à distância. A distância física acentua e evidencia a separação entre quem tenta ensinar e quem tenta aprender. A comunicação mediada por computador relativiza essa distância física, subverte o tempo,  mas não elimina o movimento que deve ser feito, por todos os atores, no sentido de encurtar a distância transacional, de estreitar o vínculo.

Como vimos, a distância física modifica materialmente mas não necessariamente condiciona o tipo de vínculo estabelecido ou mantido com alguém. Com um pequeno trabalho de pesquisa entre nossos conhecidos (usuários de Internet) poderemos encontrar pessoas que têm grandes amizades estabelecidas e/ou mantidas via computador, confidentes mesmo, e concomitantemente não mantém tal estreitamento de relações com alguém que mora sob o mesmo teto. Do mesmo modo, um professor pode ter um aluno em sala que na hora da aula fica a anos-luz de distância e, ao mesmo tempo, um ex-aluno no exterior, em viagem de intercâmbio, com o qual mantém uma relação de amizade e  troca de informações valiosas (aprendizado para ambos), mediada por computador.

Para finalizar, observe-se que o presente trabalho não teve a intenção de apontar rumos e soluções, mas lançar luz sobre um problema que existe mas nem sempre é enxergado pelos que empreendem ou utilizam os serviços educacionais, sejam eles presenciais ou à distância. O assunto, dado sua importância visceral, ainda carece de estudos e discussões que possam iluminar as idéias sobre os caminhos a seguir e até onde eles levarão.

 


6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ALVES, Rubem.  Entre a ciência e a sapiência: o dilema da educação. São Paulo: Loyola, 1999.

BELLONI, M. L. Educação a distância. Campinas: Autores Associados, 1999.

BOYD, R. A., APPS,J.W. and Associates. redefining the discipline of adult education. San Francisco: Jossey-Bass, 1980

FLAVELL, John H. A psicologia do desenvolvimento de Jean Piaget. Trad. Maria Helena Souza Patto. São Paulo: Pioneira, 1975.

GARAKIS, Solange Cescon. Divulgando Piaget: exemplos e ilustrações sobre epistemologia genética. Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 1998.

LA TAILLE, Yves de, OLIVEIRA, Marta Kohl de, DANTAS, Heloysa. Piaget, Vygotsky, Wallon. Teorias psicogenéticas em discussão. 12ªed. São Paulo: Summus, 1992.

LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. S. Paulo: Editora 34, 1993.

___________. Cibercultura. S. Paulo: Editora 34, 1999.

___________. O que é o virtual. S. Paulo: Editora 34, 1997.

MACHADO, Liliana D. O papel do professor em ambientes de educação a distância: a tutoria on-line. Dissertação de mestrado - Universidade Federal do Ceará – Faculdade de Educação. Fortaleza, 2003.

OTSUKA, Joice Lee. SAACI - Sistema de Apoio à Aprendizagem Colaborativa na Internet. Dissertação de mestrado __ Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 1999.

PIAGET, Jean. Estudos sociológicos. Rio de Janeiro: Forense, 1973.

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_______________________. Processo grupal. São Paulo: Martins Fontes, 1988.

SLUZKI, Carlos E. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. Trad. Cláudia Berliner. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.

VYGOTSKY, L.S. Pensamento e linguagem. Trad. Jefferson Luiz Camargo. 2ªed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

VYGOTSKY, L.S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. Trad. José Cipolla Neto et al. 6ªed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.